domingo, 31 de outubro de 2010

Amanhã será um novo dia!

Titã em dó maior

O paradoxo em forma de gente. Quem o vê enxerga ainda, na imagem inusual, um ser distinto, diverso, divergente. Arnaldo Antunes. Ele é mais. É um sujeito carinhoso e tanto.  Próximo, mesmo. Capaz de fazer as pessoas invadirem o palco e se agarrarem a ele, sem que isso tenha qualquer coisa de violência ou invasão.

Dono de uma poesia desconsertante, de um falar imagético, ele vai e nos leva aonde for com seus versos quase casuais. Assim, aquele ser estranho e íntimo dominou, na noite de sábado, o palco do Teatro Nacional, com casa cheia e vidrada. Som límpido, luz perfeita.

O sujeito desajeitado é, ao mesmo tempo, exercício de harmonia. Sua voz grave é envolvente e agride quando precisa. Distancia e acolhe com a mesma velocidade. Pois, é isso. Não há muito mais a dizer. Ele veio do punk, quando muita gente estranhava o movimento. E não deixou de ser. E mistura Lupicínio Rodrigues, com Cabeça Dinossauro e Tribalistas. Transita pela MPB como um clássico.

Arnaldo é tudo e mais um pouco. Quem foi, gostou. Gente nova e gente velha, lá. De olhos e ouvidos bem abertos para reverenciar, aplaudir, cantar e dançar como em poucas vezes se viu. Um show justo.Que vale bem mais do que os vinte reais da inteira. Gabriel e Mariana, meus filhos, vocês têm que ir.  Com vocês, Arnaldo, o Antunes.

sábado, 30 de outubro de 2010

Voando alto

Jeb Corliss é um Ícaro moderno. Um homem em busca de realizar o sonho mitológico de voar. Mas não é só isso. Ele ultrapassa, constantemente, o limite da sensatez, aventurando-se em vôos de beleza extraordinária e alto potencial suicida.

Em suas aventuras o erro pode significar a morte. O que o mantém vivo é uma espécie de tesão por driblar a fatalidade. A cada novo salto ele aproxima-se, perigosa e maginificamente, do belo. Neste vídeo, de tirar o fôlego, ele aponta as cenas preferidas dessa sua louca aventura. Uma dose extra de adrenalina, para começar o sábado.


Jeb Corliss wing-suit demo from Jeb Corliss on Vimeo.

quinta-feira, 28 de outubro de 2010

Perto demais do som

Macarrão, Gabriel, Armando, Mário e Lula
Ai estão os primeiros registros do Ensaio Geral, de Luiz Theodoro e companhia. Foram duas horas de trabalho intenso, passagem das músicas escolhidas, idas e vindas, pra obter as melhores imagens e o melhor som.

Mario e Lula
Posso dar o meu testemunho de que vai ser um belo show. Seis músicas para meia hora de apresentação. O om que Lula, Mário, Gabriel, Armando e Macarrão fazem tem um quê de mineiridade, apesar deles serem do mundo. Lula e Mário, cariocas de Volta Redonda, beberam da fonte do Clube da Esquina e não devem nada a ninguém.
Combinando com o "1011" a melhor tomada de cena

E olha que a troupe tem dois bons desafios simultâneos. Amanhã à noite acontece o Festival de música popular promovido pela Rádio Nacional. Lula e seus "Blue Caps" vão defender uma das finalistas, a música "Júlia", escrita por Lula em homenagem à filha dele. No sábado e no domingo, Teatro Nacional. É um bom começo pro fim do ano. Ah, ía me esquecendo: As fotos são da Suzi Theodoro.

Aquecendo as violas

Hoje é dia de ensaio geral. Lula Theodoro, meu maestro soberano, vai reunir a tropa (Macarrão, Gabriel, Armando e Mário) para um ensaio geral do show que farão, sexta e sábado, na Sala Villa-Lobos, do Teatro Nacional, em Brasília.

O show deles será a abertura da apresentação de Arnaldo Antunes. É motivo de orgulho ver os "meninos" reunidos para um espetáculo tão bacana, numa casa da importância do Teatro Nacional. Mérito da boa música que fazem, já de longa data.

Meu ingresso está garantido. Aliás, as apresentações vão render um clip e um pequeno documentário, que terei a honra de escrever e dirigir, com a ajuda valiosa do pessoal da AB Produções. Mais na frente, por certo, terei outras informações aqui. Por enquanto, bom trabalho e casa cheia ao Lula e companhia.

E, claro, quem estiver em Brasília, não perca o show.

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Prova isso

* Maurilo Andreas


Estava conversando com Madame Carmita Almeida e ela se lembrou de como as pessoas do interior têm mais leveza com a tragédia. No interior, pelo menos em Minas, sempre tem uns casos assim:

- Deca, o Julinho de Neuza levou uma chifrada de vaca e tá todo aberto ali na beira da estrada.
- É mesmo? Noooooossinhora... vou lá ver como é que ele tá.

E pronto, lá se vão as comadres olhar o rapaz agonizante com a maior calma do mundo. É o que eu chamo de dividir o horror.

Sem querer ser preconceituoso (e acho que até já falei disso antes), mas mulheres também têm um pouco disso quando o assunto é comida, por exemplo. Um homem prova algo ruim e, com toda tranquilidade, exclama:
- Essa merda tá estragada, vou jogar essa porra fora.

Já a mulher costuma seguir outra linha:
- Credo, isso tá horrível... prova aqui, amor, para você ver como está péssimo.

Para as mulheres, dividir o horror também é uma prova de carinho.

Maurilo Andreas é mineiro, redator dos bons, com quem trabalhei em Minas Gerais. Ele é o pai da Sophia e também é o cara do blog Pastelzinho.


terça-feira, 26 de outubro de 2010

Flor do Cerrado

foto: Ronaldo Ferreira
Ferreirinha, o fotógrafo que nos acompanha,  comparece com mais uma daquelas imagens que enchem os olhos da gente. A esta estou chamando de Flor do Cerrado porque é isso mesmo.

Onde mais a gente vê algo assim, com esse colorido, com esse tanto de vida, depois de tão longa seca? Só mesmo aqui. No Brasil Central. Nessas terras férteis de poesia e esperança.

Pra fechar o dia. E esperar que o próximo venha melhor ainda.

segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Os poetas podem ver no escuro

Acabo de devorar “Atlas”, um ensaio poético de geografia fantástica em que Jorge Luis Borges exerce o melhor da sua poesia e do seu lirismo, bem acompanhado por Maria Kodama.

Comprei o livro no sábado. Eu tinha acabado de almoçar e decidi tomar um sorvete. Passei em frente à Livraria Cultura e me apaixonei pela capa verde, com o Borges a contemplar um “não sei o quê”. Como se a vida tivesse parado ali, deixando-o compor a cena. Troquei o sorvete pelo livro. E mergulhei noite a dentro, com ele. Só parei à última página.

Borges conviveu com uma cegueira progressiva a partir dos anos 50 do Século passado. No final da vida – ele morreu em 1986 – enxergava pelos versos, através da fantasia ditada. Nunca viveu nas trevas. Ao contrário, espalhou luz com a sua poesia sobre um universo de mesmice. Dizia que os poetas, como os cegos, podem ver no escuro.

Em "Atlas" ele descreve lugares que só viu pelos olhos de sua amada. Enxerga o que poucos veem. Traduz sentimentos puros, quase banais, de forma extraordinária. A certa altura, numa viagem ao Egito e diante de uma pirâmide, ele se abaixa; enche a mão com um punhado de areia e o derrama um pouco mais adiante, dizendo – “estou modificando o deserto”.

Borges e Maria Kodama

Junto a esse olhar encantado, Borges funde memórias da leitura de seus livros preferidos e atribui sentido mítico à sua rápida passagem por lugares identificados pelas páginas de seus autores prediletos e pelo toque de suas mãos.

É esse tipo de encanto que toma de assalto todo aquele que debruça os olhos sobre as suas linhas. Borges é um presente. Foi uma bela troca. Uma casquinha de baunilha por uma viagem a seu lado. Pelas páginas do último livro que Borges publicou em vida.

Para quem não conhece ainda, vale a pena descobrir os versos de Borges musicados por Vitor Ramil, o irmão mais novo da dupla gaúcha Kleiton e Kledir. Borges sempre pensou seus poemas como músicas. Como milongas. Como as milongas que Vitor Ramil fez em seu disco “Délibáb”, um vocábulo húngaro que quer dizer “Miragem”. Aí, então, o melhor da miragem deste poeta cego, que nos faz enxergar a fantasia e imaginar o amor, como ninguém, na voz de Vitor Ramil.

sábado, 23 de outubro de 2010

Com os olhos no mundo

foto: Timothy Archibald
Há um fio casual unindo Elisa Mendes e Luis Andrade. Ela em Nova York, EUA. Ele em Campo Grande, MS. Elisa é fotógrafa. Luis também é. Mas o que os une é muito mais do que isso. Elisa tem um irmão excepcional. Luis tem um filho com a sindrome de Asperger.

Ela considera um privilégio aprender a ver o mundo através do olhar do irmão. Luis se encanta com a sensibilidade de Pipo. Luis e Elisa não se conhecem. Não sabem da existência um do outro. Mas, pelas mãos do acaso e pelo fio condutor de minhas linhas, eles agora estão juntos.

Elisa postou em seu blog um pouco da emoção que sentiu quando viu o trabalho do fotógrafo Timothy Archibald, que é pai de um menino diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista. Durante três anos ele fotografou o filho. Desse registro, surgiu o livro Echolilia. Um trabalho cuidadoso, sensível, emocionante.

foto: Timothy Archibald

Luis me contou recentemente que com um ano de idade, Pipo - segundo filho dele e Vânia - chamou-lhes a atenção por deixar de balbuciar palavras que já estava começando a aprender. Começou a ficar ausente. Começava ali também a obsessão de Luis e Vânia por saber o que acontecia com Pipo.


Vânia faz o quarto semestre de psicologia. Elisa é de Minas Gerais, mas estuda fotografia em Nova York. Pipo tem sete anos. Helena, irmã de Pipo, adora o irmão. Timothy descobriu a fotografia na adolescência.  Luis faz filmes e fotos como quem faz poesia. Dessa forma, distantes e próximos, se misturam em suas histórias. A arte de todos e de cada um permitindo que a vida siga, que o respeito se faça, que o amor prevaleça.

O fio casual que costura a cortina e a poesia, invade a manhã de sábado unindo caminhos distintos, encurtando distâncias improváveis e deixando cada vez mais evidente: a vida vale a pena.

sexta-feira, 22 de outubro de 2010

Agulha e linha

Cerzir a cortina da vida
vagar à inconstância do tempo

Que memória  ainda tens?
De mim, da rua, do vento...

Ah, essa tua mania de invadir  as tardes
de soprar as roupas brancas no varal
e sumir sem dar aviso

Lufada de ar perdida
Música que não se ouve mais

poesia da eternidade
razão sem paixão,
capaz!

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

Hermanos irmãos

Marcio de Camillo me manda um vídeo-flyer do show que ele, Rodrigo Teixeira e Jerry Espíndola fazem em Campo Grande, no dia 30 deste mês. Eu não terei como estar lá. É véspera de eleição e será impossível sair de Brasília um dia antes do segundo turno.

Mas quem tiver a chance de ir, não perca, viu! Eu recomendo. E pra atiçar a vontade, reproduzo aí embaixo o vídeo que recebi. Belo aperitivo. Sucesso inevitável. Um abraço, hermanos!

Poeminha descalço


Sentir a grama nos pés
Fremir com o doce contato
E saber no fundo da alma
Que o que dá chulé é sapato

Poeminha do Maurilo Adreas para o dia começar bem.

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Ando devagar

Marcos Mendes e Maria Cláudia são dois bons amigos. De longa data. Formam uma dupla que caminha junto na música e na vida. De vez em quando, quando a saudade bate, vou correndo vê-los. Ainda que na internet.

Nesta terça-feira chuvosa, a saudade se transforma em música e eu reparto aqui com vocês a bela interpretação de Marcos e Claudinha, para uma poesia de Almir Sater e Renato Teixeira, que se tornou nacionalmente conhecida e virou um clássico.

domingo, 17 de outubro de 2010

Falecimento de Gaiarsa

Rudá Ricci*


Mais um que vai fechando um ciclo cultural do país. José Ângelo Gaiarsa (foto ao lado) faleceu ontem, aos 90 anos. Gente mais nova que eu não deve se lembrar, mas Gaiarsa foi um psiquiatra corajoso e polêmico, que enfrentava a análise das tensões - que todos vivemos, mas nos negamos a comentar publicamete - familiares.

Pregava relacionamentos abertos e criticava duramente a (des)educação promovida pelas mães. Durante dez anos, de 1983 a 1993, ele apresentou um quadro do programa Dia Dia, transmitido pela TV Bandeirantes, em que respondia, ao vivo, dúvidas dos telespectadores sobre temas como família, sexualidade e relacionamentos amorosos.

Tenho nítida a imagem dele andando de um lado para o outro, agitado, ouvindo a voz de uma telespectadora contando suas angústias. Ele ouvia e no programa seguinte analisava. Era, quase sempre, uma análise no estilo "chute no estômago". Não chegava a ser um analista de Bagé, mas o impacto era forte.

Em seu site, deixou um texto intitulado "A matança dos inocentes" que dá a dimensão de suas provocações. Reproduzo o início do artigo:

Jeová não deve ser muito amigo de crianças. Creio, mesmo, em uma secreta cumplicidade entre Ele e Herodes, aquele que mandou matar todas as crianças com menos de dois anos quando lhe disseram que havia nascido um Grande Rei que o superaria. Na Psicanálise de Freud o “infantil” em nós é mal visto e mal falado, sinônimo de neurótico, regressivo, irracional, imaturo e mais palavrões similares. Chamar de “criança” ou “infantil” a pessoas adultas é ofensa universal significando, em paralelo com Freud, irresponsável, ignorante, bobo.
 
Rudá Ricci - Sociólogo, Mestre em Ciências Políticas e Doutor em Ciências Sociais. Diretor Geral do Instituto Cultiva e membro da Executiva Nacional do Fórum Brasil do Orçamento (http://www.forumfbo.org.br/). E assina o Blog De Esquerda em Esquerda

O som da natureza

Foto: Paulo Pinto
Jarbas Agnelli é um publicitário paulista, diretor da AD Studio. E é também o personagem principal do relato que faço agora sobre o olhar especial para as coisas do cotidiano, como pássaros nos fios da rede elétrica. A história não é nova, mas cruzou o meu caminho neste domingo de manhã e eu achei que não era à toa.

"Pássaros nos fios" se traduz em uma história de poesia e sensibilidade. Coisa simples, que todo mundo já viu, mas poucos - como o Jarbas - foram atrás de traduzir a imagem em melodia, em poesia, afinal.

Ele mesmo conta essa história, no vídeo postado aí abaixo. Pra quem não conhece, vale a pena assistir. No mínimo, vai deixar a manhã de domingo mais leve.

O filme foi selecionado para a semifinal de um concurso de vídeos organizado pelo museu Guggenheim em parceria com o YouTube. O resultado da disputa vai ser anunciado no próximo dia 21, em Nova York.

Coisas assim nos dão a certeza de que a poesia está em todo lugar. Basta a gente querer enxergar. Basta permitir que ela se achegue.

sábado, 16 de outubro de 2010

Pra Mariana - Porque hoje é sábado

Mariana desce a escada. Vem com um sorriso largo. Cara de quem acordou bem. Me olha e lasca, no meio do sorriso: "Eu estava escutando Caetano, cantando aquela música do Bob Dylan, Jokerman".

E segue falando: Me dei conta de como aquela música me lembra minha infância (que nem está tão distante assim, Mariana tem 22). A imagem que eu tenho é de acordar e aquela música entrar pelo meu quarto. E eu pensava - Caetano. E essa música que eu gosto. Certo, hoje é sábado. E o dia seguia feliz.

Porque hoje Mariana lembrou disso, aí está Caetano. Cantando a música que fazia as manhãs da infância dela mais felizes. Jokerman. Porque hoje é sábado.

sexta-feira, 15 de outubro de 2010

"Seu" Teodoro e o Boi

"Seu" Teodoro é uma figura ímpar. O nome dele, aqui em Brasília, é sinônimo da mais pura tradução do bumba-meu-boi maranhense.  Quem conhece um pouco do Maranhão (o Estado) e de sua história sabe bem o que eu estou falando.

O bumba-meu-boi está para o maranhense como o carnaval está para o carioca. Eu passei a primeira parte da minha infância embalado pelos mais diversos "sotaques" que invadiam e ainda hoje invadem a ilha de São Luis. Evidentemente, a batida que mais me marca é a do Boi da Madre Deus - lugar onde nasci.  E não podia ser diferente.

Tenho na memória uma imagem de infância que não me larga. Ao embalo da rede em que eu dormia, o som dos tambores se distanciava e se aproximava do meu ouvido até me fazer pegar no sono. Nas noites de São João, meu sono tinha o ritmo do boi; das batidas das matracas. Tinha a cor das fitas dos brincantes e a leveza do jingado dos caboclos de pena.

Personagens e cenas de um auto popular, uma festa sacro/profana, que tem suas origens em Portugal e que conta histórias de amor, traição, poder, morte e ressurreição - tudo isso regado a muita música.

Hoje, abro a internet e descubro que está começando, nesta sexta-feira, em Sobradinho, a 47 ª edição da Festa da Morte do Boi de Seu Teodoro. Este ano, a festa vai homenagear os 90 anos de Teodoro Freire, o maranhense que chegou em Brasília, nos idos de 1962 e que, desde essa época, organiza a brincadeira.

Até domingo, os brasilienses podem conhecer melhor a cultura maranhense através da lenda do boi morto para saciar o desejo de uma grávida. A história será contada por companhias brasilienses e maranhenses, vindas especialmente para a festa. 

Quatro anos atrás, "Seu" Teodoro, lenda viva do folclore maranhense em Brasília, foi homenageado com a Ordem do Mérito Cultural, pelo presidente Lula e pelo ex-ministro Gilberto Gil. O Boi do seu Teodoro é considerado patrimônio cultural de Brasília. Pra quem não conhece, aí vai  uma provinha, mas o bom mesmo, se você estiver em Brasília é dar uma chegadinha na Área Especial nº 2, Quadra 15, em Sobradinho. A entrada é franca.


quinta-feira, 14 de outubro de 2010

De volta, do centro da terra

Constelações - Miró
Como numa história de Júlio Verne, vi brotar do centro da terra trinta e três mineiros, no deserto de Atacama, no Chile. Eles passaram quase dois meses e meio presos no coração de uma mina, a quase setecentos metros de profundidade.

Gabriel, meu filho, disse "que alívio, vê-los aqui fora". Foi mais ou menos a reação de todo mundo. Numa época de superexposição midiática, com o conceito de Aldeia Global, de Marshall McLuhan levado ao extremo, dramas como esse são transmitidos ao vivo, 24 horas por dia.

Sem que se tenha controle do desfecho. Sem que se tenha medida, limite do que é público ou privado. Nesse caso, os que estavam no fundo da terra viraram objeto de desejo não só das famílias angustiadas, que torciam pelas suas vidas aqui fora, mas também dos editores, diretores, cineastas e empresários.

À perspectiva do drama (com qualquer desfecho) se junta a perspectiva de bons negócios.
Eles estão sãos e salvos. Resistiram - como heróis de uma estranha aventura casual - bem melhor do que poderíamos todos imaginar.

O que será de suas vidas, é difícil prever. Já tiveram muito mais do que quinze minutos de fama. Viveram um "Big Brother" sem querer, sem pedir. Foram selecionados por obra do acaso. Aqui fora, já experimentam os efeitos do assédio natural e enfrentam conflitos pessoais intransferíveis.

De certo, mesmo, só o fato de que há muito tempo não se via uma operação de resgate coletivo tão bem sucedida. Quantas histórias terão esses homens a contar, ninguém pode prever. Ninguém pode imaginar.

sexta-feira, 8 de outubro de 2010

Receita de infância

* Mariza Poltronieri
Esta semana assisti ao filme dos estúdios Disney: Ratatouille, uma deliciosa história sobre um ratinho chamado Remy, que quer ser chef de cuisine em Paris, mesmo contrariando todas as possibilidades.

Para isso, Remy usa um aspirante a cozinheiro que fica sob suas ordens.

Num dado momento, o restaurante onde Remy se esconde fica famoso, despertando a atenção de um crítico gastronômico. Arrogante e descrente, Anton Ego agenda sua visita para convencer-se da qualidade do lugar.

Atrapalhado, o chefe dispensa Remy e conta aos seus subordinados que o chefe da cozinha, na verdade era um rato. Todos abandonam seu posto e Remy retorna sendo auxiliado pelos outros roedores para, enfim, servir o crítico e não levantar suspeitas.

Remy escolhe um prato chamado Ratatouille para servir ao exigente cliente. O prato é original da região de Provence, na França. É feito com berinjela, abobrinha, tomate, cebola, pimentão vermelho e manjericão, cortados em cubos ou rodelas, temperados com alho e cebola e fritos no azeite.

O que me chamou a atenção no filme é a cena em que o sorumbático senhor leva à boca a primeira garfada. Como numa viagem ao tempo ele se vê menino, no sítio da família, o alimento fumegante e a mão carinhosa da mãe a afagar-lhe o rosto. Seus olhos se enchem de alegria e ele come o prato simples do campo, com uma alma de criança.

A culinária tem essa capacidade de nos fazer viajar pra qualquer lugar e a qualquer tempo. E nos fazer absolutamente felizes.

Minha receita de infância:

Filé à Parmegiana

Ingredientes:


- 400 gr de contrafilé, alcatra ou filé mignon em bifes
- Sal e pimenta do reino a gosto
- 1 dente de alho picado
- 2 un de ovo batidos com um garfo e misturados a 4 col de sopa de água, para empanar
- farinha de trigo e farinha de rosca para empanar
- óleo de milho para fritar


Molho


- 4 un de tomate batidos
- 1 cx de Polpa de tomate
- 1 un de cebola picadinha
- 1 dente de alho amassado
- 2 col de sopa de manteiga + 2 col de azeite para refogar
- 1 col de chá de alecrim fresco
- 2 folhas de sálvia frescas picadas
- ¼ de xícara de manjericão picado
- ¼ de xícara de salsão picadinho
- 1 col de chá de açúcar
- sal a gosto
- queijo parmesão ralado a gosto
- 100 gr de mussarela em fatias


Modo de preparo:


Coloque cada filé entre duas folhas de filme plástico. Achate levemente os filés com um batedor de carne. Tempere e empane na sequência: ovos, farinha de trigo e farinha de rosca. Frite os bifes e reserve.


Molho


Coloque a manteiga + azeite numa panela ou frigideira funda. Junte a cebola ralada e o alho e refogue. Junte o tomate batido, o purê de tomates e os temperos verdes. Acrescente uma xícara de água e deixe cozinhar, em fogo baixo, por cerca de 40 minutos, acrescentando mais água, se for necessário. O molho deve ficar grosso.


Coloque numa travessa refratária um pouco do molho, distribua os filés já fritos à milanesa, cubra com o restante do molho, distribua as fatias de mussarela e salpique bastante queijo ralado. Leve ao forno por cerca de 15 a 20 minutos, até que o queijo tenha derretido.


Sirva com arroz e uma salada verde.

*Mariza Poltronieri é culinarista em Maringá, PR. E tem espaço garantido aqui, para escrever sempre que quiser, sobre alquimia gastronômica. Ou, sobre o que ela desejar.

quinta-feira, 7 de outubro de 2010

Poesia em folhas secas

Dia destes, recebi um presente do meu amígo fotógrafo Ronaldo Ferreira (o Ferreirinha). Ele é desses caras que fazem da máquina uma extensão dos olhos, do coração, da alma. Voltando pra casa, ele me contou, deparou com uma paisagem impressionante. Folhas secas fazendo um tapete na calçada. Uma lindeza. Poesia em estado de arquitetura urbana. Brasília também é isso. Fiquei tão encantado com a foto, que resolvi dividir com vocês. Mas esperei uns dias, até que a inspiração para um textinho viesse. Veio hoje. Por isso, postei a foto logo aí abaixo.


E o que me fez escrever sobre ela foi a enorme coincidência entre a imagem aí de cima e as que eu vou colocar logo ali, abaixo. Essas, eu peguei no Blog da Cris Guerra. E basta uma olhada pra ver como as imagens têm tudo a ver na essência. 


As fotos foram feitas por quem tem paixão pela imagem, como quem fotografa a alma. Elas traduzem uma paisagem envolta em poesia. Uma, em Brasília. As outras, a caminho de Medina, uma cidadezinha de 26 mil habitantes, no Vale do Jequetinhonha, Nordeste de Minas Gerais.

Cris tava indo pra lá em busca de um encontro. Ía encontrar um menino a quem ela ajuda há muito tempo. Um projeto de solidariedade do qual ela não abre mão de participar. No caminho, enxergou a imagem das folhas secas, no meio do mangueiral. Decidiu mergulhar na paisagem. E terminou me fazendo enxergar essa bela coincidência entre dois pontos tão distantes do país.




Histórias distintas, fotos diferentes, Brasis surpreendentes. Só a poesia é igual.
E, no fundo, é isso o que faz a vida valer a pena.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Renovado


O inusitado
nos olhos
de quem nunca
anda reto.

A alma do avô
se encontra
no olhar
do neto.

(Poesia de Maranhão Viegas, foto de Ronaldo Ferreira)

segunda-feira, 4 de outubro de 2010

Um ano sem Mercedes

Há um ano, a música da América Latina perdia uma de suas figuras mais marcantes. Haydeé Mercedes Sosa, "la Negra" é interprete de algumas das mais belas canções que conheço. Algumas delas, me remetem a um tempo de escola, a um tempo de buscas e a um encantamento que só aos sonhadores é dado ter.

Me incluo entre os que a celebram e que sentem falta dela. Pra matar a saudade, "Gracias a la vida", uma canção de Violeta Parra que virou uma das marcas registradas na voz de "La Negra".

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Fim de festa

Tarde de sexta, nada a esperar.

O que já havia, já veio,

Não se faz, está feito

Essas poucas cabeças

Que restam

Se transformam



Se tornam

Parte de um imaginário que

Não tem hora, nem jeito, nem preço.

Que não tem escrita, que ninguém acredita

Que não está dito em lugar algum.



A isso chamamos “equipe”.

Isso somos nós.

Em carne

Osso

e voz.