segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

Cartas de Milão

Por *Eliane Di Quarto

Sexta-feira pensava no Brasil enquanto ia à escola pegar o Lorenzo. Aqui em Milão faz um tempo cinza, neblina que não permite se ver um palmo adiante do nariz, –3 graus de temperatura. Lembrei dos tempos em que cheguei na Itália, quando, no primeiro inverno, os amigos do Andrea me ligavam em casa, pra saber se eu estava bem. Nevava e eles me perguntavam se eu estava bem.

Caía a neblina, a temperatura diminuía e me perguntavam se eu estava bem. Na cabeça deles como era possível uma brasileira, recém chegada da terra do sol, estar bem com aquele frio, com aquele tempo escuro! Eu estava bem! Talvez porque ainda fosse novidade. Para os meus olhos, para o meu corpo. Talvez porque eu ainda tivesse uma reserva de serotonina, vinda do Brasil. Talvez!!!!

Lapônia, terra de Noel. Onde o dia é quase sempre noite.
No inverno de 2008 estivemos na Lapônia, Circulo Polar Ártico e, lá, se fazia dia por volta das onze e meia da manhã. Dia por assim dizer, porque o sol não se via nem de longe. Lá pelas três da tarde era já escuro, escuro. Noite, mesmo. Eu observava e via aqueles semblantes tristes pelas ruas, gente séria e de pouco sorriso!

Passaram-se alguns anos desde a minha vinda pra Europa e desde a viagem à Finlândia. Só agora, eu consigo entendê-los. Que coisa estranha esta que o inverno nos traz! Que melancolia! Em mais de 10 anos foi a primeira vez em que eu experimentei esta sensação.

Me sentia, me sinto, um pouco como um animal em letargia à espera da primavera. Na maioria dos dias, lá pelas quatro e meia da tarde está escuro e às sete e meia da manhã acordamos com o, ainda, escuro. É certo que a luz solar é um grande estimulante dos mecanismos biológicos que regulam o estado de ânimo mas não sabia fosse uma sensação assim tão constante, tão lenta! E é difícil manter a alegria, o sorriso. Enfim, o bom humor!

Dia de inverno, em Milão
Visto da janela do apartamento, às quatro da tarde.
A vontade é de passar o dia em casa, cozinhando coisas quentes, em volta da mesa, diante de um cálice de vinho. Todos os projetos vão ficando pra depois porque se caminha pra cá e pra lá sem muita meta, sem muitos objetivos mas é preciso trabalhar, levar os filhos à escola, ao futebol, ao médico, ao cinema! Acontece, no futebol, de tentar ver o Lorenzo da beira do campo mas não conseguir, tamanha é a neblina.

Pra emergir começo a pensar na primavera! Ainda faltam 2 meses e pra driblar o tempo procuro na net algo sobre o novo CD da Marisa Monte que eu ainda não ouvi e nada sei sobre ele. Música e uma roupa mais colorida hoje! Sabe-se lá!!!

Eliane Di Quarto é jornalista, nasceu em Mato Grosso do Sul e está em Milão há mais de dez anos. É casada com Andrea, um editor italiano, e mãe de Lorenzo e Sophia. Entre uma troca de fralda e outra, ela sempre arranja um tempinho para escrever. E toda vez que me manda, sabe que tem lugar garantido aqui para os seus textos.

Nenhum comentário:

Postar um comentário