domingo, 23 de junho de 2013

Short cuts de domingo

A futura presidente

Mariana, na esteira da história
O telefone toca.
Foi difícil escutar em meio a tanta gritaria. Milhares de pessoas em volta.
Mariana atende: Oi, ! Nana (é assim que Isabel, minha mãe, chama Mariana) tá tudo bem? Onde você está? Estou aqui, em cima da rampa do Congresso Nacional, no protesto, vó! Meu Deus, menina, não vai cair dai. Viegas (é assim que ela chama o Viegão, meu pai, quando o assunto é sério), sabe onde tua neta está? Na rampa do Congresso, no protesto!

Mariana ri do outro lado. Cadê o Bi (Bi é Gabriel, o irmão de Mariana e neto de Dona Isabel)? Ele tá aqui também, vó! Viegas, o Bi também tá junto. Os dois estão lá. Viegão pede pra falar com Mariana. Oi, vô! Oi, Nana. Olha, vê se arruma uma confusão ai e vai presa. Daqui uns 30 anos, quem sabe, você vira presidente. Foi assim que a Dilma começou.

As primeiras lágrimas do gás

Gabriel, construindo seu caminho
Deu meia-noite e eu fui vencido pelo cansaço. Gabriel ainda na rua. No protesto. Um misto de orgulho e receio, característico de quem ama os filhos e teme pelo desconhecido diante deles. Na verdade, teme não estar por perto, caso eles precisem. Não que estar por perto pudesse mudar as coisas. Mudaria apenas o fato de estar junto. De enfrentar junto. De compartilhar o que quer que fosse. Essa onipresença inatingível e o que tira o sono dos pais - hoje, é mais fácil compreender.

Durmo a noite inteira. Acordo e vejo o Bi despertado. E ai, filho, como foi ontem? Foi bom, pai. Muito bom. Emocionante. Só aquele tal de gás lacrimogêneo é que eu não curti.

Penso comigo, a primeira lágrima de gás lacrimogêneo a gente nunca esquece. A história vai-se fazendo.

Direto do passado

Foto: Arquivo Estadão
Naquele dia, naquele lugar, eu construía a minha história
e testemunhava o nascimento de um outro país
Era o ano de 84. Eu estudava no Rio Grande do Sul. Naquela época ainda se viajava de carona. Eu fui de São Leopoldo a São Paulo, mochila nas costas, vento na cara, "no dedão" e com a coragem dos ignorantes (no sentido semântico da palavra).

Cheguei em São Paulo no dia do grande comício das diretas, na Praça da Sé, que reuniu mais de 300 mil pessoas, num tempo em que não havia redes sociais. Um feito. Uma afronta ao regime. Um pequeno ato popular, um grande passo em direção à democracia.

Meu coração tomado de alegria cívica, parti para São Luis, no Maranhão. Cheguei dois dias antes do comício das diretas, disposto a gritar por mais democracia, lá também. Meu pai estava na ativa, militar do exército. Não gostou da ideia. Foi o meu primeiro confronto (quase físico) com meu pai. "Filho meu não participa dessas coisas de comunista". "Sou seu filho e vou participar". Fui, sem saber se voltava pra casa. Vi Maria Aragão, uma velha líder comunista maranhense falar com a sua mente jovem e arejada. Não teve gás lacrimogêneo. Mas uma ardência interna, vinda do fundo da minha alma me fazia chorar naquela noite, sem saber exatamente por quê.

Direto do presente

O clamor das ruas encontra a cabeça branca de meu pai mais arejada. O clamor das ruas leva meus filhos às passeatas e os expõe ao gás e à vida - com a mesma intensidade. O clamor das ruas me faz refletir - em alguma esquina do tempo três gerações se encontram, caminhando na mesma direção. O vento em meu rosto tem o mesmo frescor de sempre.

3 comentários:

  1. Momento flashback total... Estou acompanhando daqui de longe mas meu coracao esta aih . Bjs, Fernanda

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  2. As gerações estão no mesmo tempo e ao mesmo tempo. A hora é agora, para filhos, pais e avós. A compreensão e a pressa de vida justa não tem idade. Bons ventos em rostos jovens e não tão jovens. Viva!

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